sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Day & Night


"There are as many nights as days, and the one is just as long as the other in the year's course. Even a happy life cannot be without a measure of darkness, and the word 'happy' would lose its meaning if it were not balanced by sadness."

- Carl Jung -

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Bola de Sabão



Beatriz sentia-se constantemente cansada. Ainda não tinha entrado na "casa dos 30", mas já tinha vivido mais do que desejaria, nos seus 27 anos de idade. Andava desmotivada, sem vontade para nada de especial... mas envolvia-se em cursos, actividades e projectos sem fim, porque tinha imensos interesses e gostava de estar ocupada. Gostava de estar em todo o lado e não estar em lado nenhum... Tinha sempre um sorriso simpático para os outros e adorava observar a interacção dos que a rodeavam... mas detestava ser observada. Bastava-lhe ser observada por si própria, ser analisada minuciosamente com uma auto-crítica implacável, sem dar hipótese a alguém que amenizasse tão duros juízos. Afastava-se, calava-se e reflectia "apenas"... sobre a sua necessidade de se proteger. Sem dar uma hipótese sequer a Alex, o seu paciente namorado que fazia tudo para a fazer feliz. Alex não se sentia cansado... era incansável nos seus esforços para compreender a sua "Bia". Esperava sempre que a sua querida decidisse sair da redoma e que fosse ela própria... Incentivava-a a isso. "As pessoas gostam de ti exactamente como tu és...". "Não me apetece...", respondia ela. "Não me apetece conversar, estar com os nossos amigos e conviver... Deixa-me estar no meu cantinho." "Um dia mascaro-me de bola de sabão invisível... e desato a voar para dentro de mim própria sem ninguém me ver!", completou Bia, parecendo uma menina pequenina, até no tom de voz suave, mas espevitado. "Tontinha... eu não deixo!" - concluiu Alex com um ar carinhoso e comicamente ameaçador - "Rebento a bola de sabão com um sopro, e tu cais no meu colo para sempre!". Ela deu uma gargalhada espontânea, que iluminou o seu rosto de miúda, antes encoberto pelas olheiras do cansaço... Iria precisar da sua bola de sabão, claro, mas isso não a faria sentir-se assim tão leve... Talvez percebesse isso um dia destes.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Culpa

Imagem Flickr

Admiti que era eu a culpada. A culpada de tudo o que estava a acontecer nos últimos tempos. Não me custa dizer que sou eu a culpada, dói mais sentir o peso dessa culpa, passado tanto tempo de me acostumar a ela, como nos habituamos a uma dor crónica que já não se dissocia do próprio corpo. Cresci numa casa com ela sempre por perto, vivi com ela e não mais a larguei.

Esperei por ti no sítio combinado, dentro do carro naquele dia chuvoso e triste. As minhas mãos estavam geladas. Tinha chovido, ia chovendo e pingando ao ritmo lá de cima. Caíam uns pingos de água pesados sobre o tejadilho, que me incomodavam, pelo eco que reflectiam cá dentro... esses pingos, que bem podiam ser lágrimas a escorregarem-me pela face abaixo, interrompiam o silêncio em que estava mergulhado o meu pensamento distante. Queria distanciar-me e fugir desta culpa, que rejeito e vou buscar, deste peso esmagador que me roubava a serenidade. Sentia-me diariamente desprovida de tudo e cheia de nada, vítima da culpa auto-imposta que crescia em torno de mim, tal teia emaranhada de receios.

Quando pensava na razão de tal peso não conseguia vislumbrar argumentos lógicos, mas o que é certo é que o sentia, por não ter tempo suficiente, por gorar expectativas, por procrastinar, por não aproveitar, por não sentir o que queria, por desiludir, por não conseguir dar mais...

E sentir tudo isto era tão avassalador que não me permitia avançar, paralisava-me e jogava-me a um canto como folha de papel amachucado.

Finalmente chegaste. O teu sorriso de menino e esse brilho no olhar deram-me esperança... em acreditar que não tinha de me sentir assim. Senti-me protegida e guardei esse momento para sempre.